A categoria de músicos enfrenta um descaso sistemático em Goiás, que envolve não apenas o couvert artístico, mas outras demandas. Segundo relatou nesta terça-feira (1/4) o presidente da Ordem dos Músicos do Brasil (OMB), Otoniel Pacheco, em debate na Assembleia Legislativa de Goiás (Alego).
“Desde 2023, estamos fiscalizando estabelecimentos e descobrindo casos em que o couvert não é repassado. Além de situações em que o músico não tem sequer uma alimentação decente ou água enquanto se apresenta nos estabelecimentos”, denunciou Otoniel.
A mesma opinião de músicos já conhecidos nos estabelecimentos de Goiânia. A cantora Maria Clara disse que a discussão sobre o pagamento aos artistas começou com as “afrontas” por terem que cobrar pelo trabalho. “Muitos de nós chegaram em Goiás atrás de um sonho. Eu, por exemplo, sou de São Paulo e vim para cá há nove anos. Goiânia hoje virou uma vitrine e os contratantes repassam o valor que eles querem, porque existem muitos músicos”, disse.
Ela também criticou o atraso do pagamento, além do valor não repassado integralmente aos artistas. “Essa é uma desvalorização que precisa ser questionada”, frisou.
O cantor Carlos Henrique disse que, quando começou a sua carreira há 20 anos, a situação já era difícil. Ele frisou que a atividade tem custo elevado, pois os instrumentos são caros. “Na ânsia de mostrar o trabalho, a gente acaba se submetendo a essas situações. Houve momentos em que tive que bancar a minha banda, aguardando o pagamento de cachês”, pontuou.
O cantor Igor da Silva ressaltou que a situação passa pela desvalorização dos profissionais da música. “Quando somos contratados, eles nos convocam e estipulam o valor que bem entendem e a gente acaba se sujeitando. Nossa missão não é somente cantar, mas levar alegria para as pessoas”, disse.
Legislação
A advogada Denise Dias, pioneira na defesa de músicos, disse que há que se ter uma valorização dessa categoria de forma urgente. “O couvert artístico é considerado obrigatório desde que o estabelecimento atenda alguns critérios, especialmente naqueles onde já existe a informação avisando dessa cobrança”, afirmou.
Segundo Denise, existem exceções para o pagamento, mas quando o artista faz o espetáculo, é obrigatório que o repasse do estabelecimento seja feito para ele, já que isso aumenta a audiência e, portanto, o lucro. A advogada afirmou que o artista, em si, já é o chamariz necessário, porque seu nome leva muito mais clientes ao local.
“Vale lembrar que muitas vezes são as bandas que arcam com o transporte, a acomodação e a alimentação. Em relação aos estabelecimentos de menor porte, entendo que é possível estabelecer um valor mínimo. Todo artista que é bem remunerado também remunera bem os seus músicos e seus técnicos”, destacou Denise Dias.
Parceria
A empresária Tatiana Rocha, responsável pelo Projeto Boteco da Tati, frisou que manter um bar ou restaurante tem elevado custo. Mas defendeu parceria entre os estabelecimentos e os músicos. “Como empresária há 12 anos, sei dos desafios de manter um negócio ativo em um país como o nosso, com carga tributária elevada, instabilidade econômica e burocracia. Mas também sei que a música não é um extra no ambiente de bar e restaurante, é protagonista, ela atrai e fideliza clientela”, disse.
“O repasse integral do couvert ao artista é uma evolução urgente para reconhecer o músico como prestador de serviço autônomo com direito a negociação direta e digna”, frisou. Tramita na Alego um projeto de lei, do deputado Gugu Nader (Avante), que termina que os valores cobrados a título de taxa artística sejam repassados integralmente aos músicos.